A expressão são-nicolauense “palmanhã dja da facada” é uma metáfora usada para significar o alvorecer, o amanhecer, o romper do dia, o nascer do dia, nada tendo que ver, ao contrário do que “da facada” pode sugerir, com a violência que tem afectado muitas das ilhas de Cabo Verde.
Felizmente, a ilha do Chiquinho, do Seminário, do dragoeiro, do Monte Gordo, da Rotcha Scribida, das conservas de atum, da farinha de mandioca, da suave aguardente e dos “patche-parloas” – termo jocoso com que, em parte devido à sua pronúncia específica, são por vezes apelidados os são-nicolauenses – continua a ser uma das ilhas mais tranquilas do Arquipélago.
Com a justa reputação de ser uma gente tranquila, alegre, bem-humorada, pacífica, empática, solidária e altruísta, os são-nicolauenses, que também são gente determinada, perseverante e muito trabalhadora, têm-se visto obrigados, devido aos poucos recursos e parcas infraestruturas da ilha, a procurar alternativas noutras partes de Cabo Verde e do mundo.
O próprio Toy Djack mudou-se, em 1983, com a sua mulher e filhos, para a ilha de São Vicente, que oferecia melhores condições de ensino (nessa altura, em São Nicolau, só se podia estudar até ao 9.º ano).
Consciente de que, na fase inicial do processo de desenvolvimento dos países, é frequente a concentração de recursos em duas ou três cidades, o que faz com que as restantes se desenvolvam muito lentamente, verificando-se uma fuga de pessoas para zonas com melhores condições de vida e mais oportunidades, mas também consciente de que já não se está nessa fase inicial do processo de desenvolvimento do País, Toy Djack demonstra o seu desconforto com a disparidade nos níveis de desenvolvimento das diferentes ilhas do Arquipélago.
Afastando qualquer postura de vitimização ou resignação, Toy Djack apela ao dinamismo [Ó São Nicolau/O dia já nasceu/Levanta-te!/Põe os pés no chão!], à proactividade [Faz-te ouvir!], à diplomacia [Discute os teus direitos] do povo de São Nicolau, que quer que lute de forma humilde, que se sinta e seja o responsável pelo próprio desenvolvimento.
Nesta coladeira, Toy Djack tenta levantar o moral do seu povo, apresentando-se sereno, cauteloso, com espírito motivador e, sobretudo, confiante, como se pode ver pela forma como a termina, com palavras das suas netas Hédine e Mara – “Ela está lá escondida / Quem de direito / Algum dia vai olhar para ela”.
O autor desta composição não é político, mas tem um toque de líder motivacional e inspirador. Os seus descendentes que o digam!
Lisboa, Junho de 2012
Amílcar Silva dos Santos